Histórias Aleatórias

E o Sol resolveu nascer firme e forte hoje. Aproveitou que a Lua deu uma varrida na casa durante a noite e retirou todas as manchas brancas do chão deixando os azulejos anil lustrosos. A despeito de um azul nítido, o estranho do meu lado na parada de ônibus comentou que estava “céu de brigadeiro”. Fiquei na ignorância. Tentei, mas não vi flocos nem nada preto ou mesmo marrom borrando o tapete celestial. Enfim sua condução chegou e foi embora deixando-me com mais uma interrogação na vida.

Sigo fielmente as leis universais e silenciosas da vida por isto pouco reclamo do destino. Por exemplo, sei que meu ônibus sempre demora, independente de qual estou esperando. Por isto, apenas me encosto em algum lugar a fim de ser abraçado por um pouco de sombra e fico a espiar o eterno caminhar do tempo.

Espiando o povo mesmo. Melhor do que novela.

“Babá machuca bebê, mãe é presa e pai está hospitalizado!”.

Esta manchete, particularmente, chamou-me a atenção. Era a capa de um folhetim qualquer que o motorista do último ônibus estava lendo. Por isto mesmo não pude me aprofundar no tema. Mas tentei procurar o jornal na banca e não achei um só exemplar. Também pudera, com uma notícia bombástica desta. Qual seria o enredo? A motivação? As consequências de tal crime? Será algum conluio entre a mãe e a babá? Eram amantes e queriam incriminar o pai? Ou a progenitora, na ânsia de proteger sua prole e conquistar vingança, matou a babá? Talvez um triângulo amoroso ciumento? O que aconteceu?

Enquanto aguardava um próximo motorista bem informado vi um casal de adolescente conversando como só adolescentes sabe conversar: gritando.

_Você o quê?!?!?! – O garoto com olhos escandalizados era juiz e delegado contra sua própria namorada. Ao mesmo tempo que tentava entender o que ele acabara de falar, a julgava com um tom de voz tempestuoso.

_Não, não... nada não. Me desculpa meu amor, por favor.

Coitada, dava para ver lágrimas formando-se em sua face. Apesar da maciez própria da juventude, sua pele enrugara-se de forma a transmitir uma mensagem de arrependimento e vergonha. O que será que ela fez? O traiu com outro? Propôs uma noite tórrida de sexo com um amigo? Algum fetiche doido?

Para minha felicidade, a jovem namorada continuou a falar.

_Eu sei que você não gosta meu amor. Mas é que eu adoro durmir de conchinha...

Para mim foi demais. Decidi intervir na discussão. Felizmente o meu ônibus chegou. Ponderei um pouco e resolvi subir. Era melhor mesmo. Acredito que devemos seguir as leis silenciosas da natureza e existe outra lei importante: se seu ônibus chegou, suba.

Mais uma vez fui agraciado com as benesses do destino. Creio que isto ocorreu por conta desta minha convicção de obedecer as regras. Algum passageiro deixou o folhetim escandaloso com aquela matéria da babá encima da última cadeira vazia da condução. Não sabia o que estava me deixando mais feliz, ir sentado ou matar minha curiosidade. Bom, não iria precisar decidir mesmo. Sentei e saciei a sede de respostas.

O furo jornalístico era exatamente o que pensava. A mãe reagiu. Não exatamente do jeito que eu pensei claro.

Acontece que os pais da criança instalaram uma dessas babás eletrônicas com câmera encima do berço da cria com uma destas fitas colantes. Mas o serviço foi de porco, segundo a avó materna, “tudo é culpa do preguiçoso do pai que nunca prestou para nada”, mas vai saber! O fato é que a câmera caiu encima do coitado do menino que se pôs a fazer o que melhor sabe fazer neste mundo: chorar escandalosamente.

A mãe, em um claro acesso de fúria e desejo de vingança, jogou a babá eletrônica pela janela. Neste momento, o pai, coitado, tinha ido na feira comprar verdura, estava passando bem embaixo do prédio e foi atingido na testa.

No final, todo mundo se deu mal: a mãe foi prestar esclarecimento, o bebê perdeu o sono, o pai só acordou no outro dia no hospital (ainda levou um esporro porque não comprou os tomates) e a babá perdeu sua função.

“Babá machuca bebê, mãe é presa e pai está hospitalizado!”.

Dizem que até hoje o jornal nunca vendeu tanto exemplar quanto deste dia. Até deram uma babá eletrônica nova para o casal e mandaram um eletricista instalar.

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